A American Airlines Inc. e a Swissport
Brasil Ltda. foram condenadas a indenizar um agente de proteção da
aviação civil que foi submetido ao poligrafo (conhecido como detector de
mentiras) durante sua seleção para a função. A Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, fixou em R$ 25 mil o
valor a ser pago ao trabalhador, por considerar que o procedimento
adotado na entrevista violou o principio consagrado em normas
internacionais sobre direitos humanos de que ninguém é obrigado a
produzir provas contra si mesmo.
Polígrafo
Na
reclamação trabalhista, o agente de proteção disse que foi contratado
pela Swissport, mas prestava serviços para a American Airlines. Entre as
suas funções estava a de verificar a existência de drogas, explosivos
ou qualquer outro artefato que pudesse colocar em risco o avião,
inspecionar todos os procedimentos relativos às bagagens, funcionários e
equipamentos e realizar varredura interna das aeronaves. Segundo ele,
após os ataques terroristas de 11 de setembro, essas tarefas são
consideradas atividade-fim, especialmente para a American Airlines.
Como
fundamento ao seu pedido de indenização por danos morais, ele disse
que, durante a sua seleção para o trabalho, foi submetido por 30 minutos
a questionamentos sobre sua vida íntima e pessoal, sobre possíveis
roubos em valores superiores a 70 dólares, adesão a grupos de esquerda,
prisões na família, uso de remédios controlados, sexualidade e religião,
sendo equiparado a um “terrorista”. Sustentou que a legislação
brasileira não admite que nem mesmo suspeitos de homicídio sejam
submetidos ao detector de mentiras, assegurando-se dessa forma o direito
à privacidade, à dignidade e à autodefesa.
Primeiro e segundo graus
O
juízo de primeiro grau entendeu que o interrogatório tinha como
propósito único verificar quem de fato preenchia os requisitos
necessários para desempenhar a função agente de proteção e, embora
estivessem no campo da intimidade, tratava-se de um cuidado necessário,
em benefício de todas as pessoas que utilizam os serviços aéreos.
Segundo a sentença, uma contratação descuidada poderia abrir a
oportunidade para que alguém ingressasse nas aeronaves portando armas e
explosivos. Concluiu, assim, que o uso do polígrafo não configurava dano
moral à honra ou à dignidade do agente e julgou improcedente o pedido
de indenização. O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA)
manteve a sentença.
Direito ao silêncio
O
relator do recurso do agente, ministro Lelio Bentes Correa, assinalou
em seu voto que o procedimento adotado pela empresa é incompatível com
normas de direitos humanos ratificadas pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que consagram o princípio de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si, e também à Constituição Federal, que assegura, no artigo 5º, inciso LXIII, o direito ao silêncio.
Para
Lelio Bentes, é evidente o constrangimento a que foi submetido o
empregado ao ser compelido a revelar detalhes de sua intimidade que não
tinha intenção de compartilhar, e ressaltou que países como Canadá,
Estados Unidos e França já aboliram o uso do polígrafo, por se tratar de
método “tecnicamente questionável, invasivo e desproporcional”, e é
curioso no Brasil a prática ainda seja adotada por empresas
estrangeiras.
Segundo o relator, o
resultado obtido pelo polígrafo é meramente estimativo e sintomático, e
não pode ser considerado procedimento que vise à promoção da segurança
nos aeroportos e para tripulantes e passageiros, na medida em que não
permite diagnóstico seguro sobre a idoneidade moral da pessoa. “Não é
aceitável que se pretenda obter segurança a partir de medida edificada
sobre o alicerce da dúvida, da incerteza e da violação de direitos”
asseverou.
O ministro Hugo Carlos
Scheuermann, ao seguir o voto do relator, destacou que a questão está
sendo discutida na Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, em
processo cujo julgamento aguarda retorno de vista regimental.
Fonte: TST