Gerente com poder de mando e gestão não tem direito a hora extra
Os amplos poderes de mando e gestão conferidos ao empregado dentro
do setor de produção, aliados ao salário diferenciado, configuram cargo
de confiança. Logo, o seu titular não tem direito de pleitear horas
extras, pois não precisa cumprir as regras da jornada de trabalho
previstas no artigo 62, inciso II, da Consolidação das Leis do Trabalho.
O fundamento levou a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4a.
Região (Rio Grande do Sul) a reformar, no aspecto, sentença
que condenou uma empresa a pagar horas extras e reflexos a um
ex-gerente em determinados períodos de sua atuação, em ação ajuizada na
1ª Vara do Trabalho de Lajeado.
No primeiro grau, o juiz Neuri
Gabe reconheceu, na sentença, que a situação trazida aos autos era
complexa, pois o autor trabalhou por 27 anos em várias unidades da
empresa pelo Brasil, em cargos com diferentes nomenclaturas. Conforme os
autos, ele teria trabalhado como ‘‘gerente’’, ‘‘especialista de
processo’’, ‘‘gerente de processo’’, ‘‘gerente de processo de produção’’
e ‘‘gerente de processos de aves’’ — como informado pelo ex-empregador
durante a instrução processual.
Depois de analisar a escassa
documentação ofertada pela empresa e ouvir as testemunhas, o julgador se
convenceu de que o autor fazia jus ao pagamento de horas extras — com
jornadas informadas na inicial — só naqueles períodos em que atuou como
‘‘especialista de produção’’ ou ‘‘especialista de processo de
produtividade’’. É que tais cargos, com base na percepção das
testemunhas, não são tidos como de confiança, com encargos de gestão.
No
entanto, quando este atuou como ‘‘gerente de produção’’, ‘‘gerente de
processo’’ ou ‘‘gerente de processo de aves’’, estava enquadrado na
referida norma da CLT, já que presume gestão e comando. ‘‘Nesses
períodos, não cabe cogitar de horas extras, inclusive por eventual
ofensa ao intervalo mínimo de uma hora, tendo em vista a liberdade e a
autonomia que o reclamante tinha para definir o seu tempo de trabalho e o
próprio horário’’, observou na sentença.
Primazia da realidade
A relatora do recurso da reclamada no TRT-4, desembargadora Ana Rosa
Zago Sagrilo, observou que, embora não tenha sido anexado aos autos os
contracheques de todo o período de duração do contrato de trabalho, o
vultoso salário do reclamante embutia a gratificação mínima de 40%. E o
pagamento dessa parcela adicional, explicou no acórdão, é condição
essencial para permitir o enquadramento na exceção prevista naquele
dispositivo da CLT.
Conforme a desembargadora, a prova testemunhal
mostra que todas as atividades desenvolvidas pelo reclamante se
revestiram de expressivos poderes de mando e gestão, pois chefiava
enorme contingente de empregados num setor inteiro. Afinal, abaixo dele,
estavam apenas os gerentes-gerais das unidades e os diretores da
empresa. ‘‘Portanto, nada ampara qualquer interpretação de que não
haveria cargo de gestão apenas em função da mudança de denominação da
função nesse ou naquele período.’’
A julgadora destacou ainda que o
fato de a gestão praticada pelo reclamante se dar mais na área técnica
não retira o poder característico do cargo de gestão, evidenciado pelo
seu expressivo salário e pelas suas atribuições. "Aplica-se, à espécie, o
princípio da primazia da realidade a partir do conjunto probatório,
ainda que a reclamada não tenha juntado os contracheques do período
imprescrito."
Fonte: ConJur